“A coisa mais importante para mim é descobrir o tamanho do fosso (moat) que existe em torno do negócio. O que eu amo, claro, é um grande castelo e um grande fosso com piranhas e crocodilos.”
Warren E. Buffett
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O que é Moat?
Moat é fosso em portugûes.
Ele é um termo popularizado por Warren Buffet. Refere-se à capacidade de uma empresa de manter vantagens competitivas sobre seus concorrentes, a fim de proteger seus lucros de longo prazo e seu market-share. Assim como um castelo medieval, o fosso serve para proteger os que estão dentro da fortaleza e suas riquezas de forasteiros.
Por que importa?
Moat é uma forma de conservação da criação de valor das empresas. Ele afasta concorrentes que estão interessados em usufrir dos retornos e do crescimento de uma organização que está gerando valor. É um inibidor do “mar vermelho" para setores.
Para uma empresa ser muito bem sucedida, a vantagem competitiva precisa ser alta para permitir que o poder de ditar preço permaneça estavél assim como suas margens de lucro.
Estamos tentando descobrir o que está mantendo o fosso - por que esse castelo ainda está de pé? E o que vai mantê-lo de pé ou fazer com que não esteja de pé daqui a cinco, 10, 20 anos.
Warren Buffet
Tipos de Moats
Dentre os mais comuns, podemos citar:
Efeito de Rede: Em sua essência, acontece quando o valor do produto (e da rede) aumenta a medida que um novo usuário é adicionado. Airbnb, Craigslist, Whatsapp são exemplos de empresas que desfrutam desse efeito de rede. A defensibilidade se dá pelo fato de que é praticamente impossível replicar a rede em um curto espaço de tempo.
Alto custo de troca: A integração do produto é tão profunda com cliente que o leva a ter um altíssimo custo de troca caso queira usar outra solução.
Sistemas de gestão (ERPs) são bons exemplos dessa defensibilidade: trocar é extremamente honeroso para a empresa em termos de produtividade nos primeiros meses, além de exigir muito treinamento. Outro exemplo é o Spotify: Eu poderia estar no youtube music, mas meu apego emocional as minhas playlists representa um alto custo de troca .
Há uma tendência que os custos de troca estão se tornando cada vez menores à medida que a tecnologia está mais avançada e integrada.
Economia de escala e vantagem de custo: O custo de se produzir um novo produto ou de prover um serviço diminui a medida que novas vendas ou usuários são adicionados. Mercado Livre é um ótimo exemplo: a medida que mais vendas são realizadas em uma região, o custo logístico (full-fillment e last mile) por cliente diminui. Para replicar o custo baixo que o Meli tem para atender um cliente de ~Recife, precisaria de uma base de compradores e vendedores tão grande quanto na região.
Branding ou Reputação: A marca ou imagem da empresa é tão forte que consumidores querem se manter associados devido a identificação ou reputação. Por exemplo, a Redbull tem na sua marca associada ao movimento e vida ativa uma grande defesa em relação aos outros energéticos.
Ativos intangíveis: Construir algo diferente que seja impossível de replicar é uma maneira comprovada de construir um moat. Isso pode assumir formas diferentes, incluindo propriedade intelectual, patentes, marcas registradas, acordos comerciais, cultura corporativa.
As patentes são comuns na indústria médica, enquanto a propriedade intelectual é frequentemente uma característica da indústria do entretenimento. Outro exemplo é a cultura corporativa que também é uma forma de vantagem competitiva intangível, pois garante alta produtividade e tende a atrair os melhores talentos do setor. Outro exemplo aleatório de moat são acordos comerciais de longa duração como contratos de exploração de petróleo e aeroportos.
Trajetórias e evoluções dos Moats
Sou da teoria que, quando as empresas estão no início, ainda não há moats/defensibilidade. Por outro lado, moats são previsíveis e devem ser teorizados desde o momento de ideação. Dito isso, é importante que no early stage empresas estejam idealizando e refletindo sobre esse tópico.
Ao contrário dos fossos estáticos de um castelo, empresas precisam de defensibilidades que se adaptem constantemente as novas realidades impostas pela inovação constante da sociedade.
Segundo Mike Tian, Portfolio Manager da WCM Global Equity Fund, as vantagens competitivas duradouras de empresas são uma manifestação da combinação de algum dos moats citados acima. Para ele, empresas de sucesso evoluem os seus moats ao longo dos anos, agregando novas camadas a cada fase. Além disso, é preciso analisar defensibilidades a partir de uma graduação e não da perspectiva binária (ou tem ou não tem).
A maior parte das defesas podem ser evoluidas. Se a minha empresa detém efeito de rede, o meu objetivo para elevar o moat deve ser aumentar o número de interações entre os membros da rede. Se a minha empresa tiver alto custo de troca como moat, devo fazer com que meus clientes fiquem cada vez mais presos e integrados para elevar esse custo. Essa tese evolucionista gera negócios com maior defensibilidade.
Além de ir mais a fundo em uma defensibilidade, a criação de novos moats a serem combinados é uma característica em comum das empresas mais duradouras e inovadoras do mundo. Um ótimo exemplo no Brasil é o Mercado Livre: Ele nasceu como marketplace que conectava compradores e vendedores (com o efeito de rede como principal moat) e agregou ao longo do tempo duas barreiras fortíssimas: (1) Logística, que gera uma relevante economia de escala (moat) para entregar por todo o Brasil (88% das vendas da Meli passam pelo Mercado Envios) e (2) Pagamentos, que gera um custo de troca (moat) ainda maior para os sellers (95% das transações da Meli passam pelo Mercado Pago).
Outro exemplo interessante são os B2B Marketplaces. Apesar de terem nascido com a perspectiva inicial de conectar buyers e sellers (moat: efeito de rede), muitos tem criado produtos financeiros a fim de gerar fidelização e novos produtos para os clientes, agregando novos moats que os protegem da concorrência (moat=alto custo de troca).
Por exemplo, a Cayena, marketplace B2B investida pela Astella, além de conectar distribuidores e restaurantes, também passou a agregar a solução transações financeiras que geram mais valor para tanto sellers quanto buyers.
Moats na era digital
A digitalização dos negócios vem provocando mudanças numa velocidade nunca antes vista. Através da internet, é possível alcançar e vender para praticamente qualquer pessoa. Isso torna a dinâmica de defensibilidade ainda mais fluída e dificil de analisar no longo prazo. É a era mais fácil da história para começar novos negócios (e consequentemente, ter competidores).
Por outro lado, a internet promove uma dinâmica de concentração e de mercados “winners-take-all", no qual o líder detém uma vantagens competitiva tão fortes que se torna quase impossível para os concorrentes. Essa tese está muito presente no livro 0 to 1 do Peter Thiel, que argumenta que investidores devem buscar mercados monopolistas no qual os lucros estão reservados para os ganhadores. E para Peter, mercados monopolistas tendem a ter barreiras de entrada como Efeito de Rede, Economias de Escala, alto custo de troca ou branding. São moats iguais aos descritos acima.
Na minha visão, a era da internet exige que o olhar para barreiras de entrada sejam ainda mais necessárias, principalmente se você tiver o sonho de fundar ou investir em unicórnios.
Ameaças
O que chamamos de “moat” é o que outras pessoas podem chamar de vantagem competitiva. . . É alguma coisa que diferencia a empresa de seus concorrentes mais próximos – seja em atendimento ou baixo custo ou gosto ou alguma outra virtude percebida que o produto possui na mente do consumidor versus a melhor alternativa . . . Existem vários tipos de moats. Todos os moats estão se alargando ou se estreitando – mesmo que você não possa vê-lo.
Warren Buffet
Para analisar vantagens competitiva, o framework das 5 forças de Porter continua a ser uma das melhores alternativas. O estrategista recomenda usar a análise da indústria para entender “os fundamentos da concorrência e as causas profundas da lucratividade”. Ele argumenta que a força coletiva das cinco forças determina o potencial de uma indústria para a criação de valor. Ao projetar as 5 forças, é possível entender a força do moat e se ele está aumentando ou diminuindo ao longo dos anos.
No fim do dia, o valor de uma empresa está atrelado a sua geração de fluxo de caixa futuros (dinheiro disponível em uma empresa que sobra após todos os gastos serem quitados). A capacidade de produzir esses lucros está diretamente relacionado a força dos seus moats, fazendo que seja crítico focar nas defensibilidades desde cedo.
A chave para investir não é avaliar o quanto uma indústria vai afetar a sociedade, ou o quanto ela vai crescer, mas sim determinar a vantagem competitiva de uma determinada empresa e, sobretudo, a durabilidade dessa vantagem. Os produtos ou serviços que possuem fossos amplos e sustentáveis ao seu redor são os que oferecem recompensas aos investidores.
Warren Buffet