Bem vindo ao Sunday Drops, uma newsletter dominical sobre tecnologia, startups e futuro.
1/Set - #103
Antes de ir para o artigo:
Você já se perguntou o que é o MBA de Stanford? Como é viver no Vale? Quais as discussões? Baseado nessas curiosidades, convidei o meu amigo Bruno Koba para o episódio desta semana do Sunday Drops Podcast. Foi um papo que se estendeu além do tema: Falamos do futuro do trabalho, sobre geopolítica, o que é overrated e underrated em Stanford, inteligência artificial e sociedade.
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Você sente que está correndo mais para ficar no mesmo lugar?
O dilema da Rainha Vermelha não sai da minha cabeça.
Basicamente, ele diz que, para avançar, é preciso correr duas vezes mais rápido.
O termo, de origem biológica, tornou-se famoso em 'Alice no País das Maravilhas':
Alice percebeu que, apesar de correr mais rápido, não saía do lugar. Vendo a menina frustrada, a Rainha Vermelha disse que é preciso correr o máximo possível para ficar no mesmo lugar e que, se ela realmente quiser ir a algum lugar, será preciso correr duas vezes mais rápido.
Para repetir o crescimento da minha newsletter do ano passado, sinto que preciso dobrar a qualidade do que escrevo. Empreendedores relatam algo similar: para crescer hoje, parece mais difícil e assim precisam se esforçar o dobro. Influenciadores enfrentam o mesmo desafio, precisando se empenhar ainda mais para manter sua relevância.
O dilema da Rainha Vermelha é reflexo da competição acirrada que vivemos. Em um mundo onde todos competem com todos, a internet nos deu acesso a qualquer pessoa, empresa ou conteúdo, em qualquer parte do mundo.
Como consumidores, é incrível. Estamos na era de maior captura de valor. Posso pedir uma pizza de qualquer lugar da cidade: do Ipiranga a São Mateus. Já como fornecedor, é desafiador: se fosse pizzaiolo, competiria com qualquer pizza da cidade, de São Mateus ao Ipiranga. A captura de valor é mais difícil para este lado.
No universo da tecnologia, o dilema da Rainha Vermelha se manifesta de diferentes maneiras. Vou explorar três dessas manifestações que considero fundamentais: no desenvolvimento de produtos, na taxa de graduação de venture capital, e no mercado de trabalho:
1) Produto
Quem é o do mundo de startups já escutou essa frase de Reid Hoffman:
"se você não tem vergonha do seu MVP, é porque lançou tarde demais,"
A real é que cada dia mais essa frase não se aplica mais a realidade pois a exigência de qualidade do consumidor aumentou e há mais concorrência. A barra está mais alta.
Podemos simplificar a história do software assim:
Para ter sucesso na primeira era de software (2000-2015), era preciso resolver uma dor. Assim surgiu a primeira geração de softwares generalistas que resolviam alguma necessidade complexa de forma muito bem feita, como ERPs e CRMs (Ex: TOTVS, Salesforce, HubSpot, RD)
Na segunda era, vieram os softwares verticais (2013-YTD): resolver um problema relevante para uma categoria, como CRM para a indústria farmacêutica (Veeva), para restaurantes (Toast), para a indústria de viagens (TripActions). Esses softwares passaram a adicionar um layer de pagamentos, o que torna a operação mais complexa, mas captura um maior job-to-be-done dos clientes
Agora estamos entrando numa terceira era, em que, além de ser um software robusto que resolve diferentes problemas, também entrega uma nova camada de inteligência ou de serviço. Escrevi sobre isso na revolução da inteligência:
"A consequência de AI para os negócios é a elevação do nível de competição, e para uma boa parte das categorias, acrescentar um 'system of intelligence' será mandatório para o sucesso. Já para os clientes, os produtos serão melhores e mais completos."
Por exemplo, para um CRM, não bastará "apenas" registrar os dados dos clientes e criar um sistema de trabalho para os vendedores. Será preciso também ser um sistema de inteligência que ajude o time de vendas a performar. By the way, é isso que o Einstein da Salesforce se propõe.
Isso ainda é futurista. A maior parte das aplicações não está acontecendo na escala, mas é a revolução que já vemos sinais hoje e que será complexa.
Sarah Tavel, partner da Benchmark, decreta que, nesta era, é preciso vender o trabalho, e não o software. Dito isso, 20 anos atrás, de forma simplista, a evolução do JBT ao longo dos anos foi:
Ter um sistema que digitalize transações (primeira geração).
Ter um sistema focado em uma vertical que digitalize transações/processos e efetue pagamentos (segunda geração).
Ter um sistema focado em uma vertical que digitalize processos, efetue pagamentos e tenha uma inteligência que auxilie na performance, além de ofertar outros produtos que façam o trabalho (como serviços).
Por mais que o custo de criar software tenha reduzido, o nível de entrega e complexidade esperados para se destacar é maior. É o efeito da Rainha Vermelha.
2) Taxa de graduação de Venture Capital
A taxa de graduação histórica do seed round para a série A é de 27-32% após 2 anos. Saiu o resultado da safra de Q1 2022, e essa taxa caiu para metade, entre 14% e 15,4%. Este declínio é explicado pela trajetória cíclica do mercado de Venture Capital, mas retrata a dura realidade atual: hoje é pelo menos duas vezes mais difícil levantar capital.
Para levantar capital, é preciso ser duas vezes melhor, ou seja, correr duas vezes mais rápido.
Um fato é que a indústria encolheu e há menos capital para investir disponível. Na paralela, escuto relatos de investidores que dizem que há menos empresas com métricas de crescimento incríveis. Isto pode ser o primeiro indício de uma era em que a competição se torna mais insana de forma geral.
3) O futuro do Mercado de trabalho
No episódio lançado hoje no Sunday Drops Podcast, Bruno Koba levanta uma questão extremamente relevante:
O Job Market hoje está bastante difícil. Mesmo para MBAs que se formam em Stanford, Harvard, as top schools nos Estados Unidos. Trabalhos como Go-to-Market, Sales Representatives, BizDev em startups tem sido automatizados e diminuiu a quantidade de vagas.
É um job market difícil mesmo pra pessoas mega qualificadas e com mais layoffs acontecendo no mundo de tecnologia, isso só vai piorar. Então, eu fico bastante preocupado com o cenário do mercado de trabalho no mundo no futuro e, ao mesmo tempo, acreditando no potencial de AI.
Muitas vezes, temos a visão ingênua de que a tecnologia vai apenas nos liberar de tarefas mundanas e repetitivas. No entanto, o outro lado da moeda é que as ferramentas tecnológicas e a AI elevam as expectativas sobre a qualidade e a quantidade do trabalho produzido. Apenas entender de estratégia e negócios pode não ser mais suficiente para acessar as mesmas oportunidades de antes. Talvez seja necessário adicionar habilidades como programação, escrita ou outros atributos valorizados. Em resumo, será preciso mais para alcançar o mesmo patamar.
O que está acontecendo nas melhores universidades do mundo é um presságio do que veremos em 5-10 anos em outros lugares. Um exemplo claro disso é o caso da Klarna (que também comentamos no pod): ela é uma empresa de buy now, pay later que está se preparando para um IPO. Saiu a notícia esta semana que eles cortaram cerca de 40% de sua força de trabalho, utilizando AI/Tech para automatizar tudo o que é possível, gerando um tremendo ganho de eficiência em suas operações.
Curiosamente, poucos jornalistas discutiram as implicações desse gigantesco layoff, que é emblemático. Se o caso dele for sólido e acontecer em outras empresas de tech, há uma consequência clara para o mercado de trabalho: será muito mais competitivo para empresas de tech, o que conversa com o que estamos vendo hoje no job market.
Você sabe o que está em comum entre todas essas histórias?
É que para se destacar, você precisa ser excelente. E excelência vem de dois aspectos: a) ou você é melhor que todos b) ou você é diferente de todos.
Felizmente, ou infelizmente porque irá afetar toda a estrutura social, a mediocridade vai ser muito afetada. No mundo atual, a excelência não é apenas uma vantagem competitiva—é uma necessidade.
Nos resta correr mais rápido. A excelência nunca foi tão importante.
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