Tecnologia na América Latina é mais sobre inclusão do que disrupção.
Shu Nyatta, Managing Partner SoftBank Latin America Fund
Na sua famosa palestra "Competição é para perdedores"1, Peter Thiel argumenta que nos mercados competitivos o lucro é escasso. Sua dica para os empreendedores é: evite ao máximo a competição, pois ela provavelmente vai desgastar e te dar baixos retornos.
Seguindo a mesma linha, Clayton Christhensen, professor da Harvard Business School, escreveu no livro “O dilema da inovação” que a forma como empresas disruptoras desbancam incumbentes é alcançando a classe de clientes NonComsuption (Não consumidores). Segundo Clay, empresas medíocres focam nos competidores vigentes ao invés de pensar em como incluir pessoas ou empresas que ainda não são consumidores.
Em entrevista para Harvard2, Clay disse:
O disruptor está, portanto, competindo não contra outros fornecedores, mas contra o "não consumo". Está criando novos consumidores. “A inovação transforma algo que custava tanto, só os muito ricos tinham acesso”, explica. “Essas inovações o tornam tão acessível e simples que pessoas normais podem fazer o que apenas os ricos e muito qualificados poderiam fazer antes
A inabilidade em comprar dos não consumidores tende a estar vinculada a três variáveis: Custo, inconveniência ou complexidade.
Segundo a tese do dilema da inovação, existem três tipos de inovações:
Sustaining Innovations
Inovações que entregam produtos com melhor perfomance para uma classe de consumidores já existentes.
Efficiency Innovations
Inovações que permitem empresas fazerem mais com menos.
Market Creating Innovations
Inovação que mira não consumidores que se beneficiariam do produto.
O último critério, que é a pauta do texto, a Market Creating Innovations transforma produtos complicados e caros em mais simples e baratos, tornando-os acessíveis a um número significativamente maior de pessoas na sociedade. As inovações criadoras de mercado puxam as pessoas do não consumo para o consumo. As empresas que se dedicam a esses tipos de inovações são os motores do crescimento econômico de uma economia.
O tema do Non-Consumption é ainda mais forte em mercados emergentes como a América Latina, que por questões sociais e econômicas a maior parte da população não participa do consumo de bens e serviços que são utilizados em massa pela população mais rica. Essa situação representa uma grande oportunidade para as startups na América Latina. Elas têm o papel de democratizar o consumo de tecnologia e serviços de qualidade para uma classe imensa de "não consumidores". Vamos a mais uma frase do Shy Nitai do Softbank sobre tecnologia na LATAM retirada da entrevista com a Tech Crunch que converge com a tese do dilema da inovação.
“A grande maioria da população é mal atendida em quase todas as categorias de consumo. Da mesma forma, a maioria das empresas é mal servida por soluções de software modernas ”, explicou Nyatta. “Há muito o que construir para tantas pessoas e empresas. Em San Francisco, o ecossistema de empreendimentos torna a vida um pouco melhor para indivíduos e empresas que já estão vivendo no futuro. Na América Latina, os empreendedores de tecnologia estão construindo o futuro para todos ”.
Como podemos ver, a tese do Softbank (e da vasta maioria dos fundos de VC/Growth na LATAM) é justamente investir na inclusão via tech. A disrupção e o impacto são oriundos da inclusão.
Cases de disruptores que prosperaram ao buscar os não-consumidores na LATAM
Podemos citar o exemplo do Nubank, que se tornou maior que o Itaú em tamanho de mercado ao democratizar o acesso ao cartão de crédito (e posteriormente a conta digital) para jovens e classes sociais mais baixas. Antes do Nubank, abrir uma conta no banco era acima de tudo inconveniente e complexo.
Outro exemplo é a Omie, recém investida do Softbank e startup do portfólio da Astella. A sua missão é democratizar softwares de gestão para PMEs. Desde o começo da empresa, o CEO Marcelo Lombardo argumentava que seu maior concorrente era a Tilibra (sim, o caderno Tilibra). Ao longo da trajetória, a empresa basicamente ignorou a concorrência pois na verdade o maior limitador do crescimento era a fatia de mercado NonConsumption. Softwares de ERP para PMEs eram caros e complexos, o que afastava esses consumidores.
Mais exemplos?
- Creditas democratizou o crédito.
- 99Taxi o transporte.
- Ebanx o acesso a compras internacionais de plataformas como Alibaba e Spotify.
- Olist permitiu que o pequeno varejo vendesse online
- Trybe democratiza o acesso de jovens a educação através de cursos e ISA (Income Share Agreement)
e a lista é longa de exemplos de sucesso e em ascensão no mercado brasileiro e latino americano.
Em 2003, Clayton Christensen deu uma entrevista e falou sobre a realidade da China:
Pense na China como um local abudante de não consumo. Embora o clima possa ser quente e úmido, poucos residentes chineses têm ar-condicionado; eles são muito caros. Portanto, até mesmo um ar-condicionado miserável, mas barato, que pudesse atender a uma sala de 3 por 3 metros, poderia vender muito por lá.
O que vemos desde a declaração do professor3 é o crescimento insano das empresas chinesas. Investidores e empreendedores chinesas capitalizaram essa oportunidade em oferecer serviços aos não consumidores.
Esse é o grande impacto que nós como investidores e empreendedores podemos trazer para a América Latina: a inclusão de serviços e tecnologia de qualidade para pessoas ou empresas.