Como a Obsessão pelo Cliente Transforma Negócios
+ Dicas práticas da Alinea, Deco, Magie, Ramper e Ursula.
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8/Set - #104
O que faz uma empresa bem sucedida?
Clientes felizes. Eles pagam um valor justo, são recorrentes e te ajudam a encontrar outros clientes. Eu acredito que é um dos poucos princípios por trás de empresas de muito sucesso. Não só eu né? Jeff Bezos, Sam Walton, Steve Jobs, Mark Zuckerberg concordam.
Jeff, que é a grande voz sobre obsessão pelos consumidores, diz:
No longo prazo, os interesses do cliente e dos stakeholders estão perfeitamente alinhados.
Se o objetivo final de uma empresa, como dizia Milton Friedman, é maximizar o retorno de um acionista, podemos dizer então que o meio para alcançar isso é deixar um cliente feliz.
O objetivo deste artigo é ajudá-los a tornar uma organização customer centric a partir de exemplos. A primeira parte traz 3 formas de aplicar com exemplos de grandes empresas e na segunda parte do artigo, convidei empreendedores que admiro para trazerem exemplos de como eles fazem isso hoje na empresa deles.
Formas de tornar sua organização mais customer centric:
1) Clientes nos valores
A obsessão pelo cliente é mais do que um mantra; ela transforma a forma como uma empresa opera em todos os níveis.
A Amazon é conhecida por seu princípio de "Customer Obsession", que afirma: O core da empresa é customer obsession e não competitor obsession. Um exemplo claro é o Amazon Prime, um serviço criado para atender à demanda dos clientes por conveniência e rapidez na entrega. Essa obsessão pelo cliente levou a Amazon a revolucionar a logística e a experiência de compra online, estabelecendo novos padrões de excelência. Jeff diz: você tem que gastar 70% do tempo construindo uma incrível customer experience e 30% do tempo falando sobre a incrível ela.
O Nubank também incorpora essa obsessão em seu DNA. Um dos pilares da empresa é: Queremos que os clientes nos amem fanaticamente. Desde o início, o Nu identificou que os consumidores estavam frustrados com a complexidade e a burocracia dos bancos tradicionais. Ao focar na simplicidade e na transparência, o Nubank desenvolveu uma experiência bancária digital que conquistou a lealdade dos clientes. Essa abordagem centrada no cliente redefiniu o setor bancário digital no Brasil.
Esses exemplos mostram que a obsessão pelo cliente é uma filosofia que guia todas as operações de uma empresa. Quando o cliente é colocado no centro, ele influencia decisões de produto, marketing, logística e a cultura. Amazon e Nubank demonstram que o sucesso sustentável é alcançado quando a satisfação do cliente é tratada como prioridade absoluta, criando um efeito cascata que impulsiona a inovação e o crescimento.
Takeaway: Use a obsessão pelos clientes como um dos valores da empresa.
2)Foque no Irracional: O Poder das Emoções na Decisão do Cliente
Há uma tendência comum de atribuir o sucesso ou o fracasso de uma empresa à racionalidade. Acreditamos que, se um produto ou serviço for logicamente superior, ele será bem-sucedido. No entanto, as decisões dos consumidores nem sempre seguem essa lógica. Muitas vezes, o sucesso de um negócio está mais ligado ao que as pessoas sentem do que ao que elas pensam.
Nem todas as decisões são racionais. Usando o Starbucks como exemplo: pagar R$ 15 por um café pode parecer irracional, mas a experiência emocional - o ambiente acolhedor, a conveniência, o nome no copo - vai além do produto em si.
Para ser verdadeiramente centrada no cliente, uma empresa deve focar nas emoções. Rory Sutherland afirma: Para uma empresa ser verdadeiramente focada no cliente, ela precisa ignorar o que as pessoas dizem e se concentrar no que elas sentem.
Um aplicativo bancário pode fazer uma senhora de 80 anos se sentir insegura sem suporte adequado, enquanto um jovem de 25 anos pode se sentir incomodado com a necessidade de assistência. Empresas que capturam essas nuances criam conexões mais fortes, desenvolvendo produtos que ressoam emocionalmente com diferentes perfis de clientes.
As pessoas não escolhem o que é realmente melhor, mas o que parece ser a melhor opção. Um Starbucks aparenta ser melhor do que os outros cafés, na maior parte das vezes.
Como Sam Walton, fundador do Walmart dizia: : “O sentimento que nossos clientes têm quando saem de nossas lojas determina o quão rápido eles retornarão”
Takeaway: Foque em entender os sentimentos dos usuários no customer research.
3) WOW - Transformando Suporte ao Cliente em Encantamento
O suporte ao cliente é tradicionalmente visto como um canal para resolver problemas, um lugar onde todas as dores dos stakeholders convergem. No entanto, na visão de Jeff Bezos, o ideal seria que os clientes nunca precisassem entrar em contato com a empresa:
“A nossa versão perfeita de experiência de cliente é aquela que os clientes não querem falar conosco. Todas as vezes que alguém entra em contato conosco, nós vemos como um defeito de user experience."
Apesar disso, quando o suporte é necessário, ele pode ser transformado de uma simples função de resolução de problemas em uma oportunidade de encantar e fidelizar o cliente. Vamos explorar duas práticas que exemplificam:
Momento WOW: Surpreendendo e Encantando
Uma das práticas mais legais que já escutei é o que a 99 fazia e o Nubank faz: cada profissional de suporte recebe um valor - tipo 500 reais - para dar em "gifts" para clientes que tiveram algum problema. Isto vira vales/presentes/pedidos de desculpa e a consequência é um atendimento mais humano que tende a reter o cliente.
Time de Tech no Atendimento: Acelerando a Inovação
Especialmente nos early days, a interação constante do time de produto com o de clientes faz diferença pois acelera e muito o roadmap e entendimento das dores. Isto é uma realidade no Figma: todos os engenheiros são obrigados a passar ˜20% do tempo no atendimento dos clientes. Sob a perspectiva de custo de oportunidade, parece um desperdício gastar 20% do seu time mais caro em atendimento, mas ele empodera a criação de features corretas e mitiga o risco de criar algo que os consumidores não querem. Mais sobre o case da Figma aqui.
Takeaway: Use o atendimento a seu favor como forma de encantar ou forma de atacar os problemas dos clientes.
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De empreendedor para empreendedor
Até aqui, exploramos exemplos de grandes empresas que colocam o cliente no centro de suas operações. Mas como essa obsessão pelo cliente se manifesta no dia a dia de startups em crescimento? Para responder a essa pergunta, convidei empreendedores de diferentes setores para compartilharem algumas experiências ou rotinas práticas. Segue as respostas de empreendedores que admiro pela proximidade com os clientes, em ordem alfabética.
Uma das coisas que nos deixa muito próximos aos feedbacks de usuários para evoluir serviços/produtos é ter canal no slack em que ficam pingando os CSATs que ocorrem após touchpoints de entrega de serviço do nosso time. Os feedbacks geram bons momentos de celebração para o time, assim como reflexão sobre pontos em que precisamos melhorar.
O cuidado com essa prática é de ter uma régua clara de quando algo se torna acionável e de como precisam ocorrer os desdobramentos ao tomar uma ação - a armadilha é o time desenvolver um viés por ação e sair resolvendo desordenamente tudo que pinga ou parece uma sugestão legal. Aqui, a prática recomendada é, ao identificar um padrão de sugestões/reclamações sobre um touchpoint ou seção específica do produto, coletar insumos disponíveis ali e avaliar criticamente o problema para decidir se endereçaremos e, se sim, qual é a solução mais eficiente (importância vs eficácia vs esforço).
A atitude mais rebelde que nós temos na deco.cx em termos de obsessão com o cliente, na minha opinião, é o fato de não termos product managers. Isso faz com que os designers e desenvolvedores sejam obrigados a lidar diretamente com os nossos usuários (alguns dos quais são técnicos, e outros não), e experimentar em primeira mão as frustrações que eles estão passando, o que eles estão gostando, etc.
Isso é associado ao fato de que temos uma vez por semana um "product critique" de uma hora só discutindo o produto: o que não tá legal, qual foi um feedback novo de cliente que tivemos, propostas de UI/UX, e coisas desse sentido, onde participa o time todo. Ou seja, o time todo fala com o cliente, e o time todo discute o produto unido, uma vez por semana. Isso faz a gente resolver muito rapidamente os pontos que estão doendo, e nossos clientes percebem e apreciam a velocidade que evoluímos por causa disso.
Uma vez ouvi uma coisa genial: "anotar os bugs e features que tem pra fazer é inútil: os mais importantes os seus clientes vão reclamar/pedir 20 vezes, você não vai esquecer". O importante, na minha opinião, é não deixar o input do cliente virar bullet points num slide, e sim estar informando TODAS as conversas, todos os dias.
Tenho dúvidas sobre a ideia de criar processos ou rotinas específicas pra ser mais customer centric, porque isso implica que de alguma forma o conceito não está enraizado na cultura da organização. Acho que nada é mais importante que o poder do exemplo e como todo mundo que trabalha na empresa vê no dia a dia o cliente sendo colocado no centro das decisões.
Na Magie, desde o início nós buscamos criar uma experiência dedicada ao cliente, tanto que a primeira versão da Magie, pré AI, foi feita com meu sócio João sendo a Magie e fazendo os pagamentos pros clientes iniciais na mão. Sempre fomos muito abertos com feedback e diariamente eu respondo DMs de clientes que vem reclamar, elogiar ou sugerir. Acho que nunca parei pra pensar “agora tenho que responder cliente” é absolutamente natural porque é basicamente a razão de ser da empresa. Criamos uma inteligência artificial que atende as demandas financeiras dos clientes, com suporte humano nos casos onde humanos (ainda) são melhores.
Tem uma passagem do livro “Charles Schwab: How One Company Beat Wall Street and Reinvented the Brokerage Industry” que mostra como isso precisa antes de tudo virar um traço cultural. Nos early days da Schwab eles tinham um sistema de semáforo que mostrava o nível de ocupação das linhas que atendiam os clientes. Se ficasse vermelho, o founder e todos os demais executivos largavam o que estavam fazendo e iam atender as ligações de clientes. O cliente vem primeiro e todo o resto fica pra depois.
Pra quem quer melhorar nessa frente então, minha sugestão é repensar se ser customer centric é realmente um traço cultural da sua empresa. Caso não seja, eu acho difícil mudar com um processo específico.
Esse é o problema de muitas organizações tradicionais contra as quais estamos nos opondo. Elas são orientadas primordialmente a performance interna, remuneração dos colaboradores, acionistas ou da rede de assessores. O cliente não fica nem no pódio de prioridades: só aparece nas peças de marketing.
Na Ramper, temos uma visão pragmática: o cliente não nos contrata para ser “encantado”, mas sim para atingir um objetivo de negócios. Como empresa drivada por receita, vou separar nossa visão/ação em 3 camadas:
Estratégia: atrelar o sucesso do cliente (ter resultados de vendas com o meu software) com o comportamento da receita.
Cultura: falamos abertamente com o time que a receita cresce quando criamos cases (e não apenas “clientes”), e mais oportunidades se abrem para as pessoas quando a empresa está em crescimento.
Tático: monitoramos o engajamento e o sucesso dos nossos clientes para que atuemos proativamente em reverter a possível evasão de um cliente insatisfeito, ou até a expansão de um cliente satisfeito.
A gente tem um canal no Slack chamado #community-feedbacks e absolutamente toda interface que temos com consumidores vai pra lá
O CTO está super envolvido com pesquisa. Ele fala com os usuários constantemente. Isso é by design - isso ficar dentro de tech muda a cultura dos engenheiros pró-clientes
O que grandes empresas como Amazon e Nubank, e startups como os 5 cases acima, nos ensinam é que a obsessão pelo cliente não é apenas uma estratégia de marketing, mas um pilar central de operações, inovação e cultura. Ao colocar o cliente no centro, essas empresas são capazes de criar soluções que não apenas resolvem problemas, mas também encantam e surpreendem.
Ser verdadeiramente centrado no cliente vai além de oferecer um bom produto ou serviço; é sobre de entender as emoções, motivações e expectativas dos consumidores. Empresas que conseguem captar essas nuances criam conexões mais fortes e leais com seus clientes, gerando um ciclo virtuoso de crescimento.
Para prosperar no mercado de hoje, não basta atender às expectativas dos clientes—é preciso superá-las.
Até o próximo domingo,
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